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domingo, 24 de janeiro de 2010

* COBERTOR DE CONCRETO


Por Neir Moreira

CRÔNICA: Se terremotos são inevitáveis, deslizamentos não ocorrem por acaso. Enquanto a terra se arrepia no Haiti, ela parece querer respirar abaixo do edredom de ferro armado...

Havíamos recém chegados de viagem das férias. Era o primeiro telejornal que assistíamos em casa. E as manchetes que cobriam todos os canais eram comuns: Terremoto no Haiti. O caos da tragédia era retratado pelas inúmeras matérias ao longo do folhetim televisivo, além das imagens do horror, sons do desespero dos haitianos, silêncio dos mortos soterrados, suspiros dos sobreviventes que há mais de 72 horas resistiam à morte sob os escombros, e os socorros advindos de todas as partes do mundo na pele de asiáticos, americanos, europeus e brasileiros, é claro.

Uma cena, todavia, congelou minha alma e trouxe lágrimas à minha esposa: o resgate de um menino haitiano. A reportagem mostrou desde o olhar gélido ante a morte ao socorro militar; do suspiro da liberdade ao abraço a sua mãe. Impagável.

Não deu para continuar tomando a sopa... Nem esquecer que além das mazelas que assolam o país mais pobre da América, temos as nossas.

As manchetes nacionais que pareciam umedecer o televisor, tamanha a força das águas em diversos Estados brasileiros, contrastavam com as festas de fim de ano e as previsões bem previsíveis e que curiosamente todos os anos milhões de brasileiros aguardam ansiosamente.

Sabe-se que as enchentes têm-se tornado comuns em nosso país tanto quanto o absurdo das tragédias dos morros. Anualmente milhares de brasileiros ficam desabrigados e outros morrem em decorrência do soterramento. Na mesma velocidade que os subúrbios sobem morro acima, a morte desce ladeira abaixo. E o enigma não parece muito difícil de entender. Nem é preciso ser analista.

A natureza não aceita cobertor de concreto!

Monte virou morro. Morro virou favela. E a natureza agora começa a cobrar a taxa do condomínio.

A “Cidade Maravilhosa” também é a “Cidade Morrovilhosa”. Obviamente este problema não se restringe a uma cidade ou a um Estado apenas. É uma questão nacional. Uma cena anual. Afinal, segundo os próprios desabrigados, quem perde a casa na lama da destruição perde o terreno para o próximo inquilino da tragédia. Se de um lado o poder público pouco faz para reverter este panorama, os moradores que transformaram o bosque em quintal preferem correr o risco do imponderável.

Se terremotos são inevitáveis, deslizamentos não ocorrem por acaso. Enquanto a terra se arrepia no Haiti, ela parece querer respirar abaixo do edredom de ferro armado.

Mas, afinal o que tem a ver o Rio de Janeiro com Haiti? O mesmo que Curitiba e Maputo. Brasília e Lima.

Não importa o ponto geográfico, tragédia e solidariedade sempre farão parte da história da humanidade. Quão maior grande o caos, maior a oportunidade de expressar a bondade e amor humanos. Parafraseando o apóstolo dos gentios (o que inclui os haitianos): onde abundou o terremoto, superabundou a solidariedade.

Se o Haiti é a África da América, o Rio é o coração do Brasil.

Negros, pobres e famintos: essa não é a melhor definição dos haitianos. Talvez sejam predestinados a reviver o fenômeno da fênix. Dos escombros da tragédia um novo tempo de realizações. O caos pode ser apenas o ponto de partida de uma nova realidade.

E nesse quesito, o Brasil sabiamente pode inaugurar a ponte aérea RIO - PORTO PRÍNCIPE. Uma ponte de solidariedade, de fraternidade e humanidade.

Um RIO para socorrer um PORTO que no momento está órfão de seu PRÍNCIPE.

Mas não do “Príncipe da Paz”.

FONTE: http://www.neirmoreira.com/site/index.php?id=638

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